O dólar inverteu o sinal e passou a cair nesta quarta-feira (6), abaixo dos R$ 5,70. O início das negociações teve forte alta, acompanhando uma valorização da moeda americana no mundo todo após a vitória de Donald Trump nas eleições dos Estados Unidos, mas o movimento perdeu força ainda pela manhã.
A vitória de Trump provocou um aumento expressivo nos juros futuros americanos e, como consequência, o dólar também dispara frente a outras moedas no mundo todo. A política econômica protecionista defendida pelo presidente eleito pode prejudicar o controle da inflação americana e aumentar o endividamento do país.
Taxas de juros mais altas, por mais tempo, ajudam a valorizar a moeda americana. Com isso, o índice DXY — que mostra qual a variação do dólar em relação a uma cesta de moedas de outros países (como euro, iene, libra esterlina e dólar canadense) — tinha alta de cerca 1,5% durante a tarde.
Por aqui, o dólar comercial chegou a bater os R$ 5,86 no começo da manhã, mas recuou no início da tarde, quando era negociado perto dos R$ 5,70. O dólar turismo, que é a moeda utilizada para quem vai viajar ou fazer compras internacionais em dólar, é vendido acima dos R$ 6.
"O real já era uma das moedas que mais acumulava perda dentre os emergentes nos últimos dias em função de questões domésticas, logo, o espaço para desvalorização foi bem menor do que outros casos, como o peso mexicano e o chileno", diz Matheus Pizzani, economista da CM Capital.
Também está no radar do mercado a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil (BC). O colegiado deve promover uma nova alta na Selic, taxa básica de juros, hoje em 10,75% ao ano, e isso ajuda a segurar um pouco o preço do dólar.
"Estamos em vias de um anúncio de política monetária que certamente irá no sentido de apertar ainda mais os juros no campo doméstico, mantendo o Brasil como uma praça atrativa mesmo em meio ao cenário de força do dólar, ganho dos treasuries e perspectiva de juros mais elevados nos Estados Unidos", diz Pizzani, da CM Capital.
Além disso, durante a manhã o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que as reuniões ministeriais sobre cortes de gastos já terminaram e que o próximo passo é conversar com o presidente Lula sobre as propostas.
Essa sinalização por parte do ministro trouxe de volta ao mercado a expectativa de que um anúncio sobre quais serão os cortes de gastos públicos pelo governo está próximo, o que favorece o real.
Por sua vez, o Ibovespa, principal índice acionário da bolsa de valores brasileira, a B3, opera em baixa.
Dólar
Às 14h35, o dólar caía 0,80%, cotado a R$ 5,7002. Na mínima do dia, chegou a 5,6972. Na máxima, a R$ 5,8619. Veja mais cotações.
No dia anterior, a moeda caiu 0,63%, cotada a R$ 5,7464.
Com o resultado, acumulou:
- queda de 2,10% na semana;
- recuo de 0,60% no mês;
- ganho de 18,42% no ano.
Ibovespa
No mesmo horário, o Ibovespa caía 0,31%, aos 130.262 pontos.
Na véspera, o índice encerrou em alta de 0,11%, aos 130.661 pontos.
Com o resultado, acumulou:
- avanço de 1,87% na semana;
- ganhos de 0,62% no mês;
- recuo de 2,74% no ano.
O que está mexendo com os mercados?
O dia é de alta generalizada no dólar pelo mundo, com investidores esperando por um fortalecimento da moeda norte-americana nos anos de governos de Donald Trump. Isso porque o republicano defende uma política protecionista com a economia dos EUA, diminuindo o comércio com a China e aumentando as tarifas de importações para outros países, como o Brasil.
"Trump tem batido muito mais forte contra a China e tem atuado para restringir, principalmente, exportações de tecnologia acessível para o país asiático. Ele também tem ameaçado punir países que comecem a operar na moeda chinesa", explicou ao g1 Welber Barral, consultor especializado em comércio internacional.
"Então, com Trump, podemos ter uma sanção indireta — ou seja, uma sanção contra a China e que possa afetar as exportações brasileiras."
Esse cenário poder mexer com a balança comercial brasileira, diminuindo o nível de exportações, o que reduziria a reserva de dólares e poderia pressionar ainda mais a inflação.
Mais que isso, o protecionismo econômico de Trump pode encarecer os preços dos produtos dentro dos EUA e gerar mais inflação no país. Como consequência, o mercado espera ver taxas de juros maiores na maior economia do mundo nos próximos anos. São elas que servem de referência para o rendimento das Treasuries, os títulos públicos americanos.
Como são considerados os produtos de investimento mais seguros do mundo, as Treasuries com rentabilidades mais altas atraem investidores estrangeiros, que encaminham seus recursos para os EUA e dão força para o dólar.
Segundo William Castro Alves, estrategista-chefe da Avenue, a desaceleração do dólar em relação ao real ocorre porque a vitória de Trump já era precificada pelo mercado — e o dólar, inclusive, disparou mais de 6% só na última semana com isso no radar dos investidores.
"O mercado sempre dá uma exagerada no curto prazo e depois vê que não é bem assim. Até porque o dólar já vinha se valorizando bastante, então será que faria sentido ele continuar performando tão forte assim depois das altas que já haviam sido observadas?", pontua Castro Alves.
Além disso, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil (BC) decide hoje a nova taxa básica de juros da economia brasileira, a Selic. A expectativa é de uma elevação de 0,50 ponto percentual, o que levaria a taxa Selic a 11,25% ao ano.
Esse patamar torna os títulos públicos brasileiros mais atrativos para os investidores, que passam a receber retornos maiores. Assim, há uma migração de investimentos para o Brasil, o que pesa a favor do real.
Por fim, a perspectiva de proximidade de um anúncio sobre o pacote de cortes de gastos voltou a animar o mercado.
O governo efetuou uma série de reuniões nos últimos dias com ministros para fechar os cortes de gastos necessários para manter o arcabouço fiscal — a regra das contas públicas — operante. A expectativa é de que o anúncio das medidas possa ocorrer ainda nesta semana.
Segundo o ministro Haddad, o próximo passo é conversar com o presidente Lula sobre as propostas. "A partir da devolutiva, Lula encaminha endereçamento ao Congresso", disse. Acrescentou que o presidente da República possivelmente conversará com a cúpula do Congresso Nacional sobre o assunto.
"No fundo, a gente está vendo um andamento do pacote que deve ser anunciado até o fim da semana reduzindo o risco fiscal, que acho que é o ponto principal para que o câmbio continue num patamar elevado. Esse é o 'calcanhar de Aquiles' do Brasil. Uma sinalização feita pelo ministro traz uma atenuação para o dólar", explica Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research.