Cuiabá, 22 de Abril de 2025

BRASIL Terça-feira, 22 de Abril de 2025, 07:40 - A | A

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setor resiste

MEC quer impor provas presenciais para cursos EaD com estrutura mínima para as sedes físicas

Divulgação do novo marco regulatório já foi adiada três vezes desde o fim do ano passado, quando deveria ter sido publicado

O Globo

O novo marco regulatório construído pelo Ministério da Educação (MEC) para o ensino à distância deve trazer exigências na forma com que as instituições de ensino avaliam seus alunos, nas regras para aulas ao vivo e na estrutura mínima dos polos. O GLOBO apurou que a intenção da pasta é que haja um período de transição de 24 meses para adaptação às mudanças, que já são vistas com resistência pelo setor. Além disso, o ministro Camilo Santana revelou que alguns cursos, como Enfermagem, serão permitidos apenas com aulas presenciais. A divulgação do texto já foi adiada três vezes desde o fim do ano passado, quando deveria ter sido publicado. A expectativa, agora, é que ele saia até 9 de maio.

 Em novembro de 2024, o MEC apresentou diretrizes com detalhes do novo marco regulatório ao Conselho Consultivo para o Aperfeiçoamento dos Processos de Regulação e Supervisão da Educação Superior — um grupo formado para discutir a proposta com associações que representam diferentes interessados no tema, como empresas do setor, reitores das universidades públicas e estudantes.

Entre as mudanças sugeridas, estão, por exemplo, a obrigatoriedade de provas presenciais com um terço de questões discursivas. O ministério também quer regulamentar as aulas ao vivo transmitidas on-line, exigindo controle de presença mínima dos universitários.

Outras exigências estão relacionadas à estrutura física dos polos, como são chamados os locais que dão apoio presencial aos estudantes de educação à distância. Instalados em pequenas cidades, eles costumam ter uma modelagem simples. Algumas vezes, mais de uma instituição divide um único polo — o que o MEC quer proibir.

O ministério também deseja exigir parâmetros mínimos para esses espaços. Eles precisariam ter, por exemplo, recepção, sala de informática e local para atendimento aos alunos. Dependendo da área de ensino, também teriam que ter laboratórios físicos com “qualidade equivalente àqueles utilizados nos cursos presenciais”.

Explosão de matrículas
Fontes envolvidas nas negociações afirmam que, depois da apresentação de novembro, nada mais foi conversado com representantes do setor. A avaliação é que alguns detalhes podem mudar para o texto final, mas que o decreto deve contemplar diversos pontos abordados àquela altura, modulando apenas a intensidade das medidas.

A preocupação do governo com o ensino à distância se dá pela explosão de matrículas nos últimos oito anos — de 1,7 milhão para 4,9 milhões de alunos, um salto de 179% —, ao mesmo tempo em que os questionamentos sobre a qualidade dessa formação se multiplicam. As críticas se dão especialmente pelo fato de algumas profissões que exigem aprendizado prático, como enfermeiros e professores, estarem sendo formados com carga horária on-line cada vez maior. Alguns casos, como as licenciaturas, possuem apenas os estágios sendo realizados presencialmente.

 Na maior parte das vezes, as aulas dos cursos à distâncias se dão apenas por materiais impressos, com pouco ou nenhum contato com tutores ou professores, e sem aulas ao vivo, o que proporcionaria interação em tempo real com os docentes. Normalmente, dúvidas e comentários são feitos através de fóruns em que o aluno só tem sua resposta horas ou até dias depois.

As instituições de ensino defendem a enorme expansão da modalidade alegando que ela proporciona inclusão de pessoas que moram em áreas sem cursos de graduação ou que não têm tempo para frequentar aulas presenciais. Além disso, a mensalidade desses cursos costuma ser bem mais barata. As entidades entendem, inclusive, que as novas exigências do MEC aumentarão os preços cobrados.

Por outro lado, alguns grupos educacionais chegam a ter uma média de 500 alunos por professor. Também há quem promova diversos artifícios para facilitar a aprovação e evitar a evasão. Parte das instituições chega a comprimir um semestre em quatro meses para que o estudante curse, em um ano, disciplinas correspondentes a três semestres, o que agiliza o diploma.

— As medidas que estão sendo construídas são necessárias. O MEC está totalmente correto de querer regular o sistema — diz Carlos Eduardo Bielschowsky, pesquisador do tema que já foi secretário de Educação à Distância no Ministério de Educação, entre 2007 e 2010.

Sem ‘grandes rupturas’
A explosão da modalidade se deu a partir de 2017, quando houve uma flexibilização das regras do setor. A partir de então, a abertura de polos não precisou mais de uma avaliação prévia do MEC, por exemplo. Em 2023, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou que a pasta resolvesse falhas regulatórias para a educação à distância. Por isso, o governo publicou em junho de 2024 uma portaria determinando a construção de um novo marco e suspendendo o credenciamento de novos cursos.

Sem poder abrir vagas e diante do futuro incerto, o setor vem pressionando pela divulgação do marco. Nas últimas semanas, associações como os sindicatos de mantenedoras de ensino superior do Rio (Semerj) e São Paulo (Semesp) se manifestaram publicamente defendendo a publicação, assim como a Associação Universidade em Rede (UniRede), que representa instituições públicas. De acordo com Bruno Coimbra, diretor jurídico da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), novos investimentos estão sendo suspensos pela falta de clareza sobre os próximos passos.

— A gente precisa sair da lógica da modalidade e pensar na metodologia de ensino. Se à distância proporcionar a aprendizagem, por que proibir o uso de tecnologia? Não precisamos fazer grandes rupturas — defende Coimbra.

Um dos principais focos de insatisfação é justamente a proibição — já antecipada por Camilo Santanta — do curso de Enfermagem à distância. A carreira tinha apenas 10 mil alunos na modalidade em 2017, ou 4% dos estudantes da área naquele ano. Em 2023, o número passou para 193 mil, um crescimento de 1.830%. Nesse novo cenário, 40% dos futuros enfermeiros estão se formando com aulas majoritariamente on-line.

Procurado, o MEC informou que o tema está em fase de final de análise técnica entre os ministérios da Casa Civil e da Educação e que não é possível informar prazo para a conclusão desses trâmites.

As possíveis mudanças
* Provas: A última proposta apresentada pelo governo previa que o decreto determinaria a exigência de pelo menos uma avaliação presencial a cada dez semanas. Além disso, um terço das questões desses testes deveria ser obrigatoriamente discursiva. Outro desejo do MEC é fazer com que o peso desse exame feito fisicamente no polo seja majoritário na nota final para que ele não seja substituído por outras formas de avaliação.
* Aulas ao vivo: O plano do ministério é criar uma nova modalidade: além do presencial e do EaD, também haveria cursos oferecidos de forma semipresencial, com atividades presenciais e aulas síncronas — ou seja, transmitidas ao vivo e com interação em tempo real entre alunos e professores. Ela contaria com regras como um limite de 50 alunos por professor e controle de presença, como no caso das aulas presenciais, de pelo menos 75% para aprovação.
* Polos: O MEC defende que os polos, locais que dão apoio presencial aos estudantes de educação à distância, tenham uma estrutura mínima. Ele cita espaços como recepção, sala de informática e ambiente para atendimento aos alunos. Dependendo da área, também teriam que ter laboratórios físicos com “qualidade equivalente àqueles utilizados nos cursos presenciais”. Outra mudança é proibição de duas instituições dividirem um único polo.

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