Cuiabá, 31 de Março de 2025

ECONOMIA Quarta-feira, 26 de Março de 2025, 08:36 - A | A

Quarta-feira, 26 de Março de 2025, 08h:36 - A | A

Azeite e sardinha mais baratos

Efeito do incentivo à importação de alimentos chega aos supermercados

Ainda assim, apesar do alívio no bolso, analistas afirmam que o impacto da medida na inflação será restrito

O Globo

O governo reduziu a zero as tarifas de importação de nove alimentos para facilitar o ingresso desses produtos no mercado interno e evitar alta de preços. Levantamento feito por técnicos da equipe econômica, com base em dados do Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex), ao qual O GLOBO teve acesso, mostra que o efeito maior deve se dar nos casos em que o Brasil é grande importador, como azeite e sardinha.

 Mas já é possível verificar reduções do valor cobrado por alguns itens causados, direta ou indiretamente, pela abertura do mercado. Ainda assim, apesar do alívio no bolso, o impacto na inflação da medida será restrito, segundo analistas.

Nos supermercados, a percepção é que os preços continuam salgados. Em alguns produtos já houve “algum refresco”, mas pode melhorar.

— O preço do azeite está bom, não barato. Está mais baixo que antes, mas não chegou ao ideal. Barato pra mim é isso aqui: R$ 25,98, mas essa é uma embalagem menor, de 250ml — afirma a vendedora Suzana Ferreira, de 43 anos.

 Atualmente, 99% do azeite de oliva consumido no país vem de Portugal (57%) e Espanha (14%). Os demais fornecedores são Itália, Argentina, Chile, Uruguai, Tunísia, Turquia, Grécia e Líbano, EUA, França e Japão.

Dados da coleta de preços diária do FGV Ibre apontam que azeite, café, carnes e sardinha estão mostrando variação cada vez menor desde 14 de março, quando começou a valer a isenção de impostos para importação de alimentos. A análise considera a evolução dos preços ao longo do mês, com base em médias móveis (indicador de tendência) dos últimos 30 dias.

 — Não dá para saber se foi pela redução de imposto, mas certos itens beneficiados pelo imposto de importação zero já começam a mostrar inflação menor —afirma André Braz, coordenador dos índices de preços do FGV IBRE.

O economista lembra que o azeite, por exemplo, é mais consumido por famílias de maior poder aquisitivo e não faz parte da cesta básica. Já produtos como açúcar, café e carnes, que estão na lista de importação com tarifa zero, têm peso grande no orçamento e suas variações impactam mais o bolso do consumidor:

— Esses afetam bastante o custo de vida.

Câmbio e margem do lojista
No limite, Braz avalia que a isenção da tarifa de importação pode trazer redução nos preços de alguns alimentos e até impedir que a inflação seja maior, mas pondera que ainda é cedo para medir. Outros fatores interferem nos preços. Alguns comerciantes podem aproveitar a tarifa zerada para recuperar margens de lucro reduzidas nos últimos meses.

Além disso, o câmbio e os preços internacionais influenciam custos. Se o real se desvalorizar nos próximos meses, o impacto da tarifa zero perde força. Ou seja, o efeito para o consumidor final depende das condições de mercado, nem sempre fáceis de controlar.

Responsável pelo acompanhamento dos preços dos alimentos, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) já identifica quedas de preços em produtos como óleo de soja, ovos, carne bovina e farinha de trigo, parte em razão da redução de tarifas, direta ou indiretamente.

A estatal constatou decréscimo de 1% a 4%, dependendo do estado e em relação a fevereiro, na cotação do óleo de soja no varejo, e avalia que o resultado se deveu a um possível impacto do fim da tarifa de importação dos demais óleos vegetais.

Outro produto que apresentou queda de preço, no atacado, de 6% no Espírito Santo e 3% em São Paulo, foi o ovo, provavelmente em razão da queda da tarifa de importação do milho. A carne bovina ficou 1% mais barata em São Paulo e a farinha de trigo, influenciada pela redução do imposto sobre massas alimentícias e biscoitos, registrou queda de 5% no Paraná.

A alíquota para a sardinha importada é uma das mais elevadas, 32%. As importações vêm de Portugal (57%), Venezuela (27%) e Marrocos (12%). A indústria brasileira é a grande responsável pelo mercado consumidor interno de sardinha enlatada e continuará sendo. Portanto, garantem os técnicos, a indústria pesqueira brasileira, nesse ramo, não será impactada.

— Sardinha e azeite não têm impacto relevante no IPCA (índice oficial de inflação). Então, em resumo, é medida de pouca eficiência. Mas é uma medida de movimentação política, na medida em que o governo está atuando para fazer alguma coisa a curto prazo — avalia Carla Beni, professora de Política Fiscal da FGV,citando o restabelecimento de estoques reguladores de alimentos como medida de longo prazo de maior eficiência.

Recuperação da safra
Já há redes que confirmam a tendência de queda no preço do azeite. Segundo os Supermercados Mundial, a redução é resultado da combinação de boa safra, importação direta e redução da alíquota de importação. Segundo a rede, esses fatores “impactaram positivamente a cadeia de produção e distribuição do produto”.

A aposentada Dirce Louzada fazia compras quando uma promoção-relâmpago fez com que o preço do azeite caísse a R$ 35,90,e ela logo incluiu o item na cesta. Ela diz que outros produtos ficaram um pouco mais em conta:

— O azeite deu uma abaixada. Também percebo que o preço do arroz melhorou. Já comprei por R$ 7 e pouco, e hoje encontrei por R$ 5,50 a embalagem de 1kg.

Sócio e economista sênior da Tendências, Silvio Campos Neto lembra que o Brasil é um dos principais produtores de boa parte dos itens que tiveram tarifas zeradas, como carnes, café e açúcar. Assim, dificilmente a oferta externa terá capacidade de alterar substancialmente o equilíbrio no mercado doméstico.

Campos Neto avalia que a recuperação da safra agrícola traz perspectiva de alívio ao longo do ano, em particular entre o segundo e o terceiro trimestres, ainda que os preços de carnes devam continuar pressionados por fatores específicos ligados a esta cadeia.

 

Em 2024, o Brasil importou 36 mil toneladas de massas alimentícias, tendo a Itália, mesmo com imposto de 14,4%, como principal fornecedor. A redução da tarifa vai aumentar o ingresso de massas italianas e dos EUA.

“O consumo brasileiro ultrapassa 900 mil toneladas, e as ações de estoque público de arroz e de trigo também impactam positivamente na indústria brasileira, já que são os principais insumos para a produção nacional", diz trecho do estudo com base no Siscomex.

No caso de carnes, o Brasil deve importar mais dos EUA e voltar a comprar do Paraguai. O Brasil é o segundo maior produtor e o maior exportador do mundo.

Juliana Inhasz, economista e professora do Insper, o efeito da tarifa zerada é pontual. Ela avalia que algumas culturas serão regularizadas, por causa do aumento da oferta:

— Se o preço do café começar a melhorar no Brasil, não será por causa da redução da alíquota, e sim por conta do aumento da oferta.

 

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