Diante da disparada do dólar, que tem operado acima de R$ 6 nas últimas semanas, o Banco Central retomou recentemente as vendas de moeda norte-americana no mercado à vista.
Essas operações ajudam o BC a diminuir eventuais prejuízos, em reais, ou a impulsionar um lucro da instituição, que, se registrado, é repassado ao Tesouro Nacional — após aprovação do Conselho Monetário Nacional (CMN).
"Os valores pagos à União [relativos aos lucros da autoridade monetária] serão destinados exclusivamente ao pagamento da Dívida Pública Mobiliária Federal (DPMF)", explicou o Banco Central.
Nos últimos dias, o BC vendeu US$ 16,8 bilhões em leilões no mercado à vista. Com a cotação acima de R$ 6, são mais de R$ 100 bilhões. Atualmente, as reservas internacionais estão em cerca de US$ 350 bilhões.
Na semana passada, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, negou que as vendas de dólares tenham por objetivo reduzir a dívida pública. Segundo ele, o objetivo é combater "disfuncionalidades do mercado". E reiterou que o BC não tem meta para a taxa de câmbio.
Sem metas para o dólar, as intervenções do Banco Central, no regime de câmbio flutuante, ocorrem "caso se identifiquem condições adversas para o seu regular funcionamento". Deste modo, não tem relação com a política fiscal, ou seja, com a redução da dívida pública.
Custo das reservas internacionais
Embora sejam consideradas como um tipo de seguro para evitar o contágio da economia brasileira por choques externos, as reservas internacionais, segundo economistas, também representam custo para a sociedade.
Isso porque as reservas são aplicadas principalmente em títulos dos Estados Unidos, que rendem juros muito mais baixos do que aqueles que governo paga ao emitir papéis no mercado interno (dentro do Brasil). É o chamado "custo de carregamento" das reservas.
O custo do carregamento mostra a diferença de dinheiro teria caso, em vez de ficar com as reservas, a vendesse. Mas os especialistas alertam que não é desejável vender tudo, para o país não perder a segurança de ter um estoque considerável de dólares, a moeda mais negociada do mundo.
Segundo o economista do IPEA, Sérgio Gobetti, esse custo de carregamento no Brasil é de cerca de R$ 40 bilhões por ano. "O ataque especulativo que vivemos no Brasil abriu uma ótima janela de oportunidade para o BC lucrar vendendo dólares", avaliou, por meio de rede social.
O analista lembrou que parte do crescimento da dívida pública, nas décadas passadas, principalmente nas primeiras duas gestões do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (entre 2003 e 2010), está relacionado justamente com a compra de dólares pelo Banco Central para formar as reservas brasileiras.
"Um cálculo pelo diferencial de juros entre Brasil e EUA mostra que o acúmulo de reservas cambiais custou quase R$ 700 bilhões desde 2006. Mas esse prejuízo seria compensado se metade desse caminhão de dólares, adquiridos quando câmbio estava em R$ 1,9, fossem vendidos agora por R$ 6,1", afirmou Gobetti.
Por fim, ele avalia que é importante manter parte das reservas. "Acho apenas que exageramos no nível, mas 'felizmente' temos hoje uma ótima oportunidade de corrigir isso, vendendo dólares na alta do momento. Um 'erro' que deu 'certo', digamos assim", concluiu.
Em outubro de 2018, dois meses antes de assumir o Ministério da Economia, o economista Paulo Guedes afirmou que, se houvesse "crise especulativa" e o dólar subisse para o patamar de R$ 4,50 a R$ 5, o governo Bolsonaro venderia US$ 100 bilhões para "acelerar o ajuste fiscal", ou seja, reduzir a dívida pública.
Dívida brasileira
A dívida do setor público consolidado fechou o mês de outubro em 78,6% do PIB – o equivalente a R$ 9 trilhões, segundo informações do Banco Central.
Se for considerado o critério do Fundo Monetário Internacional (FMI), que contabiliza os títulos públicos que estão na carteira do BC e que é utilizada na comparação internacional, a dívida brasileira terminou outubro em um patamar maior ainda: em 92% do PIB.
Neste nível, a dívida brasileira está abaixo de nações desenvolvidas, próxima de países da União Europeia e acima dos emergentes, da América Latina e do Caribe.
A relação entre dívida e PIB é um indicador relevante para o mercado, interpretado como um sinal da capacidade do país de honrar seus compromissos financeiros de curto, médio e longo prazo. Quanto maior a dívida em relação ao PIB, maior o risco de um calote em momentos de crise.
Além do patamar da dívida, a performance das contas públicas também é avaliada por investidores.
No ano passado, em meio a ataques do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para baixar a taxa de juros da economia, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, explicou no Congresso Nacional como a dívida pública influencia a taxa de juros brasileira.
"Na parte dos juros, a gente não pode confundir causa e efeito. A dívida não é alta porque o juro é alto. É o contrário, o juro é alto porque a dívida é alta. Quando você endividado vai ao banco, e o banco faz uma análise que você é endividado e não paga a dívida, o juro é alto", explicou Campos Neto, na ocasião.